segunda-feira, 16 de maio de 2011

Descabido


De novo? É Sério? Nosso herói foi novamente derrotado? Então por que ele é o nosso herói? Acho que simplesmente por ele ser o protagonista da nossa história, o que é péssimo para nós, especialmente para mim. Estamos mal de herói por aqui.

Tudo começa quando nosso desavisado mocinho descobre que seu espírito ainda não perdeu por completo as forças e uma fagulha se transforma em choque que se transforma em uma corrente elétrica de milhões de volts com base em muito pouco pra começo de conversa e com base em absolutamente nada para perspectivas de um bom desfecho, mas ainda assim ele achou que conseguiria. Nesse ponto, já não sabemos se ele é muito burro ou muito ingênuo. Eu acho que é muito burro.

O que o nosso querido protagonista parece não ter entendido ainda é que peças triangulares não se encaixam em buracos redondos, aparelhos de 110v não devem ser ligados em tomadas de 220v, macarrão não pode ser feito em grelha e paredes não podem ser atravessadas se você simplesmente correr de encontro a elas. Veja bem, meu caro, ter esperanças pode até ser bonito, comum, natural e tal, mas ter esperanças de que você amanhã vai acordar com um peitoral atlético, olhos verdes, um par de asas nas costas e soltando laser pelas mãos é estupidez! Já narro suas histórias há muito tempo, não dá pra continuar desejando o impossível, pois o impossível é impossível, por isso ele é chamado de "impossível", sacou? O impossível não é uma barreira filosófica ou psicológica, ele é fato, camarada. De ovo de codorna não nasce morcego. Fato.

Como narrador, vou assumir aqui uma parte da responsabilidade, pois eu sabia bem o que estava acontecendo no grande cenário e até conseguia ver bem lá na frente, mas ainda assim não fui um bom aconselhador, não me fiz ouvir por você. Se trabalhássemos em conjunto poderíamos ter evitado muito erro, muita decepção, para ambos. Afinal, quando os espectadores sabem que o mocinho morre no final, ainda assim podem querer assistir a história por algum desejo mórbido de testemunhar a cena, mas quando o mocinho sabe que vai tomar uma surra e morrer, ele poderia pelo menos ter a opção de dar meia volta e dizer "tô fora, tchau procês que eu tenho mais o que fazer".

Mas, espere... algo me diz que, ainda asism, não é isso que você faria. Percebo algo diferente em seu olhar no espelho, algo que venho notando alterar-se aos poucos em nossas últimas aventuras, mas que agora está tão evidente. Você não faz mais questão de ceder, não é isso? Você agora se senta com um livro em hebraico nas mãos e passa as páginas lentamente e concentrado, mesmo não sabendo hebraico. Você pede um prato de camarões frescos e segura os talheres, mas fica encarando o prato sem comer nada, pois é alérgico a camarões. Você bota apenas uma bermuda e uma camiseta para ir à rua, mesmo estando no auge do inverno.

Você espera pacientemente que o livro comece a fazer sentido, ou o jogará na lareira para que seja útil de alguma forma.

Você desafia os camarões a apodrecerem diante de seu olhos, já que você não pode saboreá-los, e você sabia que faria isso desde o início.

Você encara o frio sobre sua pele e simplesmente não se importa, pois fará com que seu corpo o suporte, mantendo uma agradável e segura temperatura interna.

Você ficou escroto, ficou teimoso. Você agora pega o garfo e o entorta em colher, pois você precisa tomar uma sopa, e se o garfo não virar colher, você vai jogar fora o garfo e o prato de sopa e vai roer os próximos grãos de terra que a estrada jogar em seus dentes até que alcance a próxima paragem e se coloque novamente diante de uma refeição quente e bem temperada, e se for o caso, repetimos tudo de novo, desde o início.

Caríssimo herói descabido, cumpre a mim a missão de informá-lo que, ao que tudo indica, você está se tornando um anti-herói. Então prepare-se, pois de anti-herói pra vilão é um passo, e você sabe, os vilões costumam ser muito, mas muito mais interessantes.

3 comentários:

Unknown disse...

Muito interessante esse texto Marcos.Como sempre,genial!

Unknown disse...

Sua narrativa sempre prende minha atencao. Leve, ironica, inteligente.

Marcos AM Ramos disse...

Obrigado, obrigado. Exponho os textos aqui em busca do retorno nos comentários, e é lógico que agradar a quem lê dá um gostinho de vitória (incerta, inesperada, mas bem-vinda).