segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Entornei


Minha primeira ideia ao escrever o título deste post foi "Retorno". Depois pensei em "Retornei". Depois pensei em "Entorno". Por fim pensei em "Entornei" e foi esse que ficou.

Existe um lugar ao qual sempre sou enviado por minha mente quando bebo. Há uma culpa profunda por ser meu próprio e maior sabotador desde a mais tenra idade, e sempre que insiro álcool em meu sangue sou imediatamente afundado, cercado pelas memórias daqueles meus sentimentos que costumam ficar mais enterrados pelas pedras do passar dos anos. Não penso nisso todo dia, vivo minha vida muito bem sem pensar, sem sentir isso, sem lembrar desta história, mas quando bebo... Digamos que comigo não tem essa de "beber pra esquecer". Quando eu bebo, eu lembro.

O tema destes dias tem sido apenas um: arrependimento. Estou de férias do escritório, só retorno no dia 23 de agosto. Tenho aproveitado para dormir muito e fazer tudo na hora que eu quero. Sem maiores passeios, sem viagens, pois tive que gastar a grana pra comprar um sofá e pagar contas atrasadas. O que sobrou da grana e do tempo estou gastando em cervejas, vinhos e cinema. E em arrependimento. E em uma teoria louca que envolve voltar no tempo e bebidas alcoólicas.

Tenho ficado bêbado ao menos umas três noites por semana (estou de férias, eu posso), e a cada bebedeira eu me lembro dela, daí eu vou e vejo uma foto dela, e depois outra foto, até que eu tenha então visto todas as fotos que tenho dela. Há tanto tempo. História tão antiga. Se vocês soubessem apenas do relacionamento em si, diriam que foi por tão pouco tempo... mas e se eu contar pra vocês que foi um amor platônico que nutri por anos antes de qualquer chance de concretização? E se eu contar pra vocês que durou pouquíssimo mais que um mês de concretização apenas porque eu fui um covarde, um idiota e terminei com tudo, assim, do nada? Meu Deus, eu devia ter cerca de vinte e um anos, eu deveria ser perdoado por tamanha estupidez. Mas não consigo me perdoar... Penso em como eu poderia ter sido feliz desde aquela idade, digamos, desde o começo. Penso em como eu poderia ter evitado as três vezes em que tive meu coração irremediavelmente partido desde então, me tornando esse cara frio que sou hoje em dia aos trinta e dois. Eu tinha 21, eu tive medo do compromisso, eu tive medo da responsabilidade, eu confundi a porra toda! Eu entendi tudo errado! Eu tomei as decisões erradas!

Não. Nada disso. Dou um tapa na minha cara, depois mais um, me levanto e bebo um copo de água muito gelada. Apesar de tudo, pasmem, eu não conseguiria ser tão egoísta assim. Ela hoje é feliz, então beleza. Tudo certo no fim das contas.

Afinal, qual seria minha escolha se, naquela época, eu pudesse ver como seriam nossas possíveis vidas futuras? Decidir entre a minha felicidade ou a dela? Isto seria tão cruel quanto. Não não... seria mais cruel. E vocês, se pudessem voltar no tempo, teriam feito algo diferente em suas vidas?

Dizem que o álcool libera nossos freios morais, deixa livres aquelas verdades que escondemos sob os códigos de conduta e as máscaras que achamos por bem usar em sociedade. "IN VINO VERITAS", diziam os antigos. Entornei 5 latas de cerveja bem gelada. Entornei-as pela minha garganta adentro nesta madrugada fria de segunda-feira e as verdades transbordaram. Não aguento mais. Quero ir dormir. Depois eu faço a revisão do que digitei aqui.

Na TV a cabo passa um filme no Canal Brasil (66), chamado "Sem Essa Aranha". Li a sinopse mas não consigo identificar a história no decorrer do filme, é tudo estranho, nada faz sentido. Estou cansado, nada faz sentido. Estou bêbado e me afogando em um arrependimento de dez anos atrás que nem deveria existir. São 3:44. Amanhã ao acordar estarei sóbrio e não me sentirei mais assim e vou tomar um banho e vou caminhar pelo Largo do Machado e vou tomar um café com leite em pé na padaria e vou andar até cansar e depois voltar pra casa.

Tudo faz sentido.

3 comentários:

Unknown disse...

Repare não Marquinhos, isso é coisa de quem tem mais de dez anos pra contar. :O)

Abraco,
Elis

o n z e p a l a v r a s disse...

De toda a minha curta vida até aqui - 32 anos - com a mesma profundidade abismal que existe para uma mosca negra pousada na borda, o fundo da garrafa de um chardonay, me arrependi de deixar para trás o único par digno que até hoje conheci. Pelo menos eu tenho como atribuir a miséria dos dias de hoje ao passado que joguei no ralo há dez anos atrás.

Marcos AM Ramos disse...

Estamos lendo muito a coluna do Alberto Goldin por aqui.