Estive ausente do blog. Estive ausente de mim mesmo até. Ainda estou. Venho aqui hoje buscando ao menos o mínimo de palavras certas para este momento.
Perdi um dos meus melhores amigos... Mário, meu amigo Mário. Mário César, meu amigo desde 1997, quando o usei como ponto de referência na fila de matrícula da Faculdade de Letras, no Fundão. Mário César, meu amigo, meu irmão, tão parecidos e tão opostos, nós dois. Compartilhávamos a paixão pela música e pelas mulheres, o gosto por filmes e séries de TV, a admiração pelos felinos e pela boa literatura. Dividíamos um apê de dois quartos no bairro da Glória, Rio de Janeiro, onde moramos por um ano e um mês, de agosto de 2009 até setembro de 2010.
Mário César faleceu às 7:30 da manhã de um sábado chuvoso, 18 de setembro de 2010, aos 38 anos.
Não me lembro exatamente da última vez em que o vi com vida. Acho que foi na noite de quarta ou quinta, eu estava na sala, navegando pela internet, enquanto ele e a namorada saíam para ir ao cinema, ou pra casa de alguns amigos, sei lá. Na sexta, véspera do ocorrido, eu tinha ido passar a noite na casa da minha namorada em Niterói. Passei a noite discutindo ideias, planos para os possíveis futuros, fiquei acordado até quase 4:00 da madrugada pensando em que rumos tomar na minha vida com ela.
Às 8:00 da manhã meu celular toca. Stella me ligando. Stella diz "Marcos... Aconteceu uma coisa muito ruim. Aconteceu uma coisa ruim com o Mário. O Mário, ele morreu. Estamos todos aqui na sua casa te esperando, vem logo pra cá."
Não me lembro agora qual foi meu primeiro pensamento. Cogitei que pudesse ser um trote daqueles da pior qualidade, mas não consegui manter esse pensamento. Seria cruel demais, e a Stella não faria isso. Me arrumei rápido e tremendo, corri pra pegar um táxi e liguei pra minha mãe, pedindo que ela fosse o mais rápido possível pra minha casa. Quando cheguei lá os paramédicos já tinham ido. Sobraram os policiais e os amigos que tinham passado aquela última madrugada com ele, vendo filmes e fazendo traduções de não-sei-quem até as 2:00 da madrugada.
"O que aconteceu? Como foi?"
A namorada dormia ao seu lado quando acordou assustada com os barulhos e sobressaltos de Mário. Ele se contorcia e tentava puxar o ar, ela disse. Sem conseguir falar com ele, ela chamou por socorro e ligou para a ambulância, para os amigos com quem tinham passado a madrugada, fez o que pôde. Os paramédicos chegaram, o retiraram da cama e colocaram no chão da sala. Tentaram ressuscitá-lo. Não conseguiram. Mário teve um ataque cardíaco, fulminante.
Quando entrei no apartamento, encontrei meu amigo no chão da sala, camisa levantada, esparadrapos nos braços, boca aberta, olhos fechados como se dormisse. Pus a palma da mão esquerda sobre seu tórax e a direita sobre sua testa. Nada. Não havia mais ninguém ali. Mário foi embora.
Mário foi embora desse mundo sem publicar seu livro, sem lançar seu disco, sem ter desfrutado da fama e do sucesso que merecia por seus talentos de cantor, compositor, guitarrista e escritor... foi embora sem ter tido uma companheira de verdade a seu lado, sem ter tido filhos... Não viajou para o exterior, não aprendeu a dirigir, não sabia nadar. Mário não comia muita coisa além de pão com queijo e litros e mais litros de suco de laranja ou leite de soja. Não bebia cerveja nem cachaça, não gostava de nada alcoólico. Não fumava. Comia carne vermelha raramente e nos propagandeava as qualidades do hamburguer de soja.
Mário não trancava a porta da frente, nem a da área de serviço.
Mário não apagava as luzes da entrada da casa.
Mário não limpava as caixas de areia dos gatos.
Mário não colocava ração nos potes dos gatos.
Mário não lembrava o dia do aluguel.
Mário tinha uma infinita tolerância à desordem.
Mário era caos.
Mário era artista na essência, um amante da arte.
Mário era um dos sujeitos mais talentosos que já conheci.
Mário era o Mário.
Mário era o meu amigo...
Mário é o amigo em quem tenho pensado todos os dias desde aquele fatídico sábado. Mário foi meu amigo por 13 anos e será meu amigo pra sempre.
A morte do meu amigo fez minha vida mudar em menos de 24hs. Literalmente. Do sábado de manhã até o sábado de noite: recebi uma das notícias mais tristes da minha vida, tive que transmitir esta notícia à família dele, tive que providenciar a retirada do corpo de dentro de casa, providenciar o funeral, providenciar todas as documentações necessárias. Pedi socorro à minha mãe e aos meus amigos. Planos que eu estava cogitando colocar em prática dentro de um ano e meio (ou mais) tiveram que se concretizar em dias. Minha vida ainda está dando cambalhotas. Ainda não estou sendo capaz de pensar sobre minhas decisões, apenas estou decidindo. É preciso seguir em frente e bifurcações não significam mais nada pra mim, eu apenas sigo. Depois eu olho pra trás e penso. Agora não dá.
Mário era o autor do blog intitulado BLOG-IS-DEAD, para quem tiver curiosidade.
Vou parar por aqui. Fiquem em paz, obrigado por continuarem visitando meu blog e nunca duvidem de que suas vidas podem mudar em um único dia, em um punhado de horas, ou mais especificamente na manhã de um sábado chuvoso em setembro.