quinta-feira, 19 de março de 2009

Bzzzzz



Do meio daquelas lembranças incertas, peguei um pouco de silêncio para usar como se fosse estilo ou charme, sem conseguir convencer os outros espectadores que me permito (uns tantos que dentro de si paravam, mas fora de si passavam desatentos). Se ao menos você estivesse lá para assistir, eu diria que houve mérito em minha tentativa, ainda que desconhecesse ter havido de fato sucesso, o qual pode até ter havido, mas quem liga pra isso afinal quando a satisfação é puramente pessoal e independe de todo o mais? Me levo a crer que tudo passa a ser resto quando só uma específica coisa nos importa, esse é o caso hoje. Isso é um erro e você sabe, é um grande erro quando descuidamos de nossa fé sendo a fé o pouco que nos resta da coisa rala que nem existia mas que achávamos que estava lá. Antes, “nada” simplesmente não era. Hoje, “nada” apresenta-se como a ausência de algo (um dublê de conceito filosófico desses bons e baratos para discutirmos de madrugada), não mais uma etiqueta dizendo “nada” colada sobre algo que assim era considerado e nomeado, como o silêncio que simplesmente não existe, pois sempre há um bzzzzz. Preste atenção. O silêncio não funciona.

Ei-lo aqui: o nada, embrulhadinho para presente como um bebê que a cegonha traz. Sem cartão, no entanto. Desculpe.

Dessa vez, acho que o tal nada pode representar bem uma vida inteira, dormindo todas as noites mais por tédio do que por sono, com lágrimas nos olhos mais por sono do que por tristeza, com dor no estômago mais por tristeza do que por fome, e um pouco angustiado mais por... mais por desamor mesmo.

Mas isso que há, isso aqui que nos cerca sem ser ar (ou silêncio que não é nada pois faz bzzzzz), merece aplausos por ostentar uma etiqueta sem nome, a redundância retórica de tudo que acaba por ter um fim em si próprio. Você é perfeita, parabéns pra você! Oh, eu-te-amo, você tem olhos de tormenta e sempre os traz consigo. De onde saem essas coisas... “Está na Bíblia”, diga: “está na Bíblia”. Dia desses um cara disse isso, talvez pela TV.

Se a sua recordação me veio agora para me cobrar uma confissão, saiba que eu quis fazer o máximo possível, não o melhor possível. O máximo, tudo, tudo o que pude e ainda aprendi mais um pouquinho para tentar fazer mais. Juro. Ainda assim, acho mesmo legal isso agora, já era hora. Ainda bem que estamos todos preocupados com alguma coisa, ainda que seja isso, seja lá o que isso for, por nenhum motivo melhor. Por falar nisso, motivos melhores? Ora vejamos, foi sua tia (não a da peruca, a outra), num arroubo de reflexão afogada em cerveja quente, quem disse certa vez que não há motivos melhores ou piores, apenas motivos, e que ela tinha, sim, seus motivos. Depois vomitou. Lembro porque quem limpou fui eu. Sua tia era uma ridícula. A da peruca também. Sua família toda. Todos naquela festa também. Também todos os que não foram naquela festa, o que se não me engano inclui o resto do mundo, daí então são todos ridículos, incluindo a mim que ainda por cima tive que ficar pra depois.

Espero que fique claro por que quero apenas dormir dormir dormir dormir dormir dormir dormir.

Um comentário:

mario elva disse...

Dorme com um barulho desses...